A minha incapacidade para trabalho foi reduzida em sede de submissão a nova junta médica. Mantenho os benefícios fiscais que me foram atribuídos?

A Organização Mundial de Saúde define incapacidade para o trabalho como qualquer redução ou falta de capacidade para desempenhar uma atividade de uma forma considerada normal para os seres humanos.

A atribuição do grau de incapacidade é feita em Junta Médica. Esta Junta Médica pode em determinadas circunstâncias reavaliar a minha incapacidade. 

Permita-se-nos avançar com um exemplo prático. 

No ano de 2013, o “Sr. A.” foi submetido a uma junta médica, da qual resultou a atribuição de uma incapacidade permanente global de 60%. Nesse mesmo ano, apresentou o referido atestado junto do Serviço de Finanças Local, passando a usufruir dos benefícios fiscais inerentes à sua condição de pessoa com deficiência, nomeadamente ao nível das deduções à coleta (em sede de liquidação de IRS),  isenção de ISV e do pagamento do IUC, entre outras, previstas na lei.

Em 2018, o “Sr.A” foi novamente submetido a junta médica, que incidiu sobre a mesma condição médica que havia justificado a junta médica em 2013. Aquando dessa reavaliação, e ao abrigo dos mesmos critérios utilizados na primeira, foi-lhe atribuída uma incapacidade permanente global inferior a 60%, ou seja, uma percentagem que, à partida, determinaria a perda dos respetivos benefícios fiscais

No entanto, tal não acontecerá se, em primeiro lugar, a doença que esteve na origem da atribuição da incapacidade se mantiver e continuar a constar do atestado médico de incapacidade. E se, em segundo lugar, aí esteja declarado que, de acordo com os documentos arquivados nesse serviço, previamente havia sido foi conferida uma incapacidade de 60%. Verificando-se estes pressupostos, deverá solicitar o respetivo averbamento, junto do Serviço de Finanças.

Sucede que, desde 2019, a Autoridade Tributária (AT) vem seguindo o entendimento de que apenas se mantêm os benefícios se tiverem sido utilizados diferentes critérios técnicos nas respetivas avaliações, ou seja, diferentes tabelas de incapacidade. Para a AT, se for utilizada a mesma tabela e apenas se verificar uma evolução favorável do estado clínico, o contribuinte deixará de ter direito os benefícios atribuídos.

Em obediência a esse entendimento, a AT procedeu a uma revogação dos benefícios fiscais de centenas de contribuintes portadores de deficiência que tinham visto os seus graus de incapacidade alterados em sede de reavaliação, não obstante a manutenção da patologia que a originou.

Em reação a essa circunstância a Assembleia da República aprovou, em 2021, uma norma interpretativa ao diploma que regula esta matéria – aditando ao Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, o artigo 4.º-A, com epígrafe “Norma interpretativa” – consagrando aí expressamente o princípio da avaliação mais favorável ao avaliado e colocando um ponto final nas querelas interpretativas.

Sem prejuízo da alteração legislativa, a AT tem mantido o seu entendimento de 2019, cujo conteúdo se tornou indefensável ao abrigo da atual redação da legislação aplicável. Ficará assim a cargo do contribuinte fazer valer os seus direitos junto dos serviços de finanças locais, de forma a fazer-se cumprir a legalidade, e, em último caso, o recorrer à via judicial para que garantir que esses direitos são efetivamente respeitados.

Ivo Fernandes

Advogado

Artigo de opinião inserido na rubrica Consultório Jurídico, edição de 25.2.2023 do jornal Diário As Beiras

 

Pedido de Reunião

A minha incapacidade para trabalho foi reduzida em sede de submissão a nova junta médica. Mantenho os benefícios fiscais que me foram atribuídos?

A Organização Mundial de Saúde define incapacidade para o trabalho como qualquer redução ou falta de capacidade para desempenhar uma atividade de uma forma considerada normal para os seres humanos. A atribuição do grau de incapacidade é feita em Junta Médica. Esta Junta Médica pode em determinadas circunstâncias reavaliar a minha incapacidade.  Permita-se-nos avançar com um exemplo prático.  No ano de 2013, o “Sr. A.” foi submetido a uma junta médica, da qual resultou a atribuição de uma incapacidade permanente global de 60%. Nesse mesmo ano, apresentou o referido atestado junto do Serviço de Finanças Local, passando a usufruir dos benefícios fiscais inerentes à sua condição de pessoa com deficiência, nomeadamente ao nível das deduções à coleta (em sede de liquidação de IRS),  isenção de ISV e do pagamento do IUC, entre outras, previstas na lei. Em 2018, o “Sr.A” foi novamente submetido a junta médica, que incidiu sobre a mesma condição médica que havia justificado a junta médica em 2013. Aquando dessa reavaliação, e ao abrigo dos mesmos critérios utilizados na primeira, foi-lhe atribuída uma incapacidade permanente global inferior a 60%, ou seja, uma percentagem que, à partida, determinaria a perda dos respetivos benefícios fiscais No entanto, tal não acontecerá se, em primeiro lugar, a doença que esteve na origem da atribuição da incapacidade se mantiver e continuar a constar do atestado médico de incapacidade. E se, em segundo lugar, aí esteja declarado que, de acordo com os documentos arquivados nesse serviço, previamente havia sido foi conferida uma incapacidade de 60%. Verificando-se estes pressupostos, deverá solicitar o respetivo averbamento, junto do Serviço de Finanças. Sucede que, desde 2019, a Autoridade Tributária (AT) vem seguindo o entendimento de que apenas se mantêm os benefícios se tiverem sido utilizados diferentes critérios técnicos nas respetivas avaliações, ou seja, diferentes tabelas de incapacidade. Para a AT, se for utilizada a mesma tabela e apenas se verificar uma evolução favorável do estado clínico, o contribuinte deixará de ter direito os benefícios atribuídos. Em obediência a esse entendimento, a AT procedeu a uma revogação dos benefícios fiscais de centenas de contribuintes portadores de deficiência que tinham visto os seus graus de incapacidade alterados em sede de reavaliação, não obstante a manutenção da patologia que a originou. Em reação a essa circunstância a Assembleia da República aprovou, em 2021, uma norma interpretativa ao diploma que regula esta matéria – aditando ao Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de outubro, o artigo 4.º-A, com epígrafe “Norma interpretativa” – consagrando aí expressamente o princípio da avaliação mais favorável ao avaliado e colocando um ponto final nas querelas interpretativas. Sem prejuízo da alteração legislativa, a AT tem mantido o seu entendimento de 2019, cujo conteúdo se tornou indefensável ao abrigo da atual redação da legislação aplicável. Ficará assim a cargo do contribuinte fazer valer os seus direitos junto dos serviços de finanças locais, de forma a fazer-se cumprir a legalidade, e, em último caso, o recorrer à via judicial para que garantir que esses direitos são efetivamente respeitados. Ivo Fernandes Advogado Artigo de opinião inserido na rubrica Consultório Jurídico, edição de 25.2.2023 do jornal Diário As Beiras